--- Eu tenho que olhar para a câmera, querida.
--- Olhe para a cama. A gente está em casa, não no ar.
--- Tem certeza?
--- Claro.
--- Então, por que estou de gravata?
--- Eu é que pergunto: por que você está de gravata vestido de pijama?
--- Meu Deus! Estou confuso. Jura que não estamos no ar?
--- Claro que não, querido.
--- Então, vou tirar o pijama.
--- Se você tirar o pijama e ficar só de gravata, teremos, finalmente, uma noite diferente e excitante, querido.
--- E se você desmanchar seus cabelos, querida, a noite promete ainda mais.
--- O que têm meus cabelos?
--- Reflexo.
--- Reflexo? Impossível, querido. Não sou Ana Maria.
--- Eu falo de reflexo condicionado do Pavlov. Você tem cabelos condicionados. Basta qualquer plim-plim e eles ficam todos arrumadinhos.
--- E você, querido, que repete há anos os mesmos movimentos de cabeça e de olhos diante de qualquer luzinha vermelha que vê na frente? Até farol vermelho faz você virar um ratinho do Pavlov.
--- Igual a você com aquele sorriso repetido e sem som.
--- Querido: fora do ar meu sorriso é franco e sonoro. E o seu? Desculpe, mas é tão contido que parece que você usa prótese total. E tem mais: você fala comigo com voz e texto do Jornal das Oito e, na melhor das hipóteses, com texto do Google, mas lamentavelmente com a mesma voz. Não dá para sua voz voltar ao normal, com um texto leve e improvisado, pelo menos quando estamos em casa?
---Você tem certeza que estamos em casa, querida?
--- Claro.
SILÊNCIO.
NO AR.
--- Meu Deus.--- Meu Deus.
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